Efeito home office reduz carros nas ruas de SP às segundas e sextas-feiras
24/06/2022
Lentidão média de trânsito cai mais nos dois extremos dos
dias úteis da semana, na comparação com antes da pandemia
O trabalho no sistema remoto ou híbrido, em que as pessoas
alternam alguns dias em casa e outros na empresa, pode ser responsável por uma
mudança de comportamento no trânsito de São Paulo.
Dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) mostram
que em maio passado a redução na lentidão do trânsito foi maior às segundas e
sextas-feiras, quando comparado com o mesmo mês de 2019, ou seja, antes da
pandemia de Covid-19.
Durante os dias úteis da semana, a lentidão caiu 32% em
comparação com 2019, segundo relatório da empresa ligada à Prefeitura de São
Paulo, passando de 137 km para 93 km na média geral entre 6h e 20h.
Às segundas-feiras, porém, a diminuição foi de 43% —de 114
km para 65 km, em média. Às sextas, a queda é de 35%— de 160 km para 103 km. Às
terças, a redução média atinge 28% e, às quartas e quintas, 27%.
Segundo Luiz Drouet, presidente da Associação Brasileira de
Recursos Humanos (ABRH) em São Paulo, muitas empresas que adotaram o modelo
híbrido por causa da pandemia de Covid-19, permitem o funcionário escolher os
dias em que vai fazer o trabalho remoto.
"Quando a gente acompanha essa preferência, em geral
ela se dá para que o trabalho em casa seja nos extremos da semana, às segundas
e sextas", afirma. "São dias em que as pessoas preferem ficar com a
família e evitar desgaste com o deslocamento até o trabalho", diz.
Drouet acredita que o modelo híbrido de trabalho é uma
tendência irreversível. Segundo ele, pesquisas mostram que a possibilidade de
fazer trabalho remoto é o segundo critério na escolha de um emprego, ficando
atrás apenas do salário.
Segundo o engenheiro Sérgio Ejzenberg, mestre em transportes
pela Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), os números mostram
o que já se percebia nas ruas da capital. "Com certeza, as pessoas estão
escolhendo não andar às segundas e às sextas", diz.
"Nesses dias sempre tivemos atividades extras que se
somaram às normais do dia, então a lentidão era muito maior", afirma.
"Ela cresce muito com pequenos aumentos de fluxo de trânsito."
Ejzenberg vê como significativa a queda de 32% na média geral
de lentidão no trânsito e diz que o índice pode ser ainda maior, porque o
cálculo considera os principais corredores e não os atalhos dos motoristas para
escapar de congestionamentos.
A diminuição na lentidão de trânsito nos extremos da semana
é uma tendência, acredita Ejzenberg, lembrando que no Reino Unido ocorre uma
experiência de se trabalhar quatro dias por semana com salário integral.
"A quinta está virando sexta-feira", brinca.
O profissional de marketing digital Davi Frate costuma ir
duas vezes por semana à sede da empresa, na Vila Olímpia, zona oeste de São
Paulo. E como tem a possibilidade de escolha, acredita que ganhou alguns
minutos de seu dia na última segunda-feira (20), quando resolveu adotar a
contramão de seus colegas de escritório, que preferem trabalhar presencialmente
às terças, quartas ou quintas.
"Percebi que as ruas estavam mais vazias na
segunda-feira", diz ele, que afirma ter levado cerca de 30 minutos de onde
mora, no centro, até o escritório —com trânsito, o percurso podia ser feito em
50 minutos. "Dá para notar que os bares estão mais cheios às quintas para
o happy hour, quando as pessoas saem do trabalho."
Frate conta que espera passar o horário de pico e sai de
casa sempre depois das 9h, já que o expediente é flexível. Essa é outra mudança
de comportamento notada pelos especialistas em trânsito.
Assim como Ejzenberg, Marcus Quintella, diretor da FGV
Transportes, da Fundação Getulio Vargas, apontam que os motoristas estão
optando por escolher o horário de sair de casa, e isso também está mudando o
comportamento no trânsito.
Segundo os dados da CET, às 9h, principal pico da manhã nos
meses de maio analisados, a queda foi de 35% na comparação entre 2019 e 2022,
passando de 171 km para 111 km na média geral entre os dias úteis para o
horário.
Eles citam outros dois pontos que podem ter contribuído para
a redução no trânsito: o ensino remoto e o comércio eletrônico, que consegue
acumular produtos de vários consumidores que ficaram em casa em um único
veículo de entrega ou em bicicletas.
"Isso tudo associado ao preço do combustível e ao
desemprego faz com que as pessoas circulem menos de carro", afirma
Quintella, da FGV.
O taxista João Luiz da Silva Filho vê ansiedade entre os
passageiros que pegam corridas com ele após o trabalho às sextas-feiras.
"Quando podem, saem mais cedo para voltarem logo para casa", diz ele,
que, mesmo com índices oficiais menores, afirma sofrer com congestionamentos
todos os dias.
"Mas a tendência é o trânsito não voltar àquilo que era
antes", afirma o especialista Ejzenberg. "Já não temos mais as
restrições da pandemia e os índices estão muito menores."
Fonte e Foto: Folha de São Paulo