Zoomp volta ao mercado em meio a emaranhado de processos judiciais

07/07/2017


Uma das grifes de moda mais famosas das décadas de 1980 e 1990, a Zoomp volta oficialmente ao mercado hoje, com 105 modelos masculinos e femininos que serão vendidos em 180 lojas multimarcas pelo Brasil. A campanha de relançamento da Zoomp tem o rosto de Anna Cleveland, 24 anos, filha de Pat Cleveland, musa de Salvador Dalí.

 

A Zoomp volta pelas mãos de Alberto Hiar, 52 anos, do grupo familiar K2, dono, entre outros negócios, da marca Cavalera, empresa de moda que tem 37 lojas próprias e está presente em 800 pontos de venda multimarca. Antes de criar a Cavalera, Hiar começou no mundo da moda ainda adolescente, ao montar sua primeira estamparia de camisetas.

 

No ano passado, a K2 fechou a compra da marca – sem os ativos imobiliários – por R$ 20 milhões, em um leilão realizado dentro do processo de recuperação judicial da empresa. Do total, pagou R$ 5 milhões de sinal e se comprometeu a quitar o restante 180 dias depois – o que ainda não ocorreu.

 

O êxito do retorno da Zoomp ainda é incerto, tanto por questões de mercado quanto por problemas particulares da marca. Uma das dificuldades é a economia, já que o Brasil vem de dois anos de recessão e vive um momento de desemprego alto e queda na renda real. Além disso, a dona da Cavalera constatou que os antigos donos teriam continuado a operar a marca de maneira inadequada.

 

Segundo o advogado do grupo K2, Marcus Vinicius Perello, de 58 anos, foram encontradas calças com o ícone da Zoomp – um raio – sendo vendidas na varejista popular americana Walmart por apenas R$ 50. Enquanto isso, o preço médio dos jeans da nova coleção será de R$ 400. Por isso, a K2 foi à Justiça para não ter de pagar o restante do valor referente à compra da marca.

 

Embora tenha sido uma “febre” da geração das pessoas que hoje têm mais de 40 anos, os últimos anos da Zoomp não foram de glamour. Quando a K2 fechou a aquisição da marca, a companhia já estava em recuperação judicial. Mas os credores da companhia não aceitaram a decisão da Justiça que desvinculou a compra da marca dos demais ativos, como os imóveis.

 

Por isso, eles entraram com recurso contra a transferência da marca para a K2, que ainda não foi julgado em tribunais superiores. A K2 diz que esse é o segundo motivo para não ter pago o restante do valor da marca. Ela teme que, em caso de decisão desfavorável, não consiga reaver o montante.

 

A dívida da Zoomp supera R$ 100 milhões, e a ideia era incluir os imóveis na venda para aumentar o valor a ser arrecadado. Além disso, os credores consideram baixo o valor de R$ 20 milhões que a K2 pagou pela marca. Isso porque um laudo de 2010 estabeleceu o valor da Zoomp em R$ 66 milhões.

 

O pedido da K2 para suspender o pagamento dos R$ 15 milhões restantes foi indeferido judicialmente. Agora, a estratégia da empresa, segundo seu advogado, é “esperar a decisão final para evitar prejuízo”. A Justiça determinou que a quitação fosse feita até 12 de junho, mas Perello entrou com novo recurso.

 

Segundo Thiago Peixoto Alves, advogado dos antigos donos, a proprietária da Cavalera corre o risco de “perder a marca e ainda pagar uma multa”. Antes de ser arrematada pela K2, a Zoomp pertencia à Identidade Moda, que havia comprado, em 2006, a marca do criador Renato Kherlakian, que tocava o negócio desde 1974.

 

Caminho. O retorno da Zoomp está dando mais trabalho a Hiar do que ele esperava. As negociações para adquirir a marca começaram em 2015, depois que o empresário fez uma pesquisa e constatou que, entre as grifes do passado, a Zoomp era a mais lembrada e ainda tinha imagem positiva. “A ideia é resgatar a grife mais importante do jeanswear e também um tempo de glória da moda brasileira.”

 

Segundo o empresário, a Zoomp foi inspiração da primeira estamparia de camisetas que ele abriu, aos 17 anos. Nessa época, Hiar fazia propaganda de produtos na TV gritando “O Turco ficou louco!” – apesar de ser filho de libaneses, criado em Heliópolis, zona sul de São Paulo. “A ideia é resgatar a grife mais importante do jeanswear e também um tempo de glória do mercado de moda brasileiro.”

 

Marca não tinha rivais

 

Ressuscitar uma marca como a Zoomp – que era um ícone desejado do passado – pode ter vantagens em relação à construção de uma história totalmente nova, na visão de Silvio Passarelli, diretor da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap) e especialista em marketing e criatividade. Ele lembra, no entanto, que, em seu auge, a Zoomp não tinha de enfrentar concorrentes internacionais.

 

O designer Edval Dominges, 41 anos, lembra que, no passado, a Zoomp era chique. “O raio do logotipo dava status. Tenho um tio fazendeiro, de Goiânia, que naquela época vendeu dez cabeças de gado para comprar dez calças. Queria mostrar para todo mundo na cidade que era poderoso.” 

 

A crise nas contas na Zoomp não resvalou na imagem das roupas. Em 2006, quando Enzo Monzani e Conrado Will, da Identidade de Moda, compraram a Zoomp, herdaram uma dívida de R$ 140 milhões. “O Renato (Kherlakian, fundador da marca) vendeu para os fundos, que naquela época estavam se especializando no mercado de moda, mas não tiveram dinheiro para honrar os compromissos, e a empresa se complicou”, diz Passarelli, da Faap.

 

Fundos de moda. Ao contrário do que ocorre na Europa, os fundos de investimento em moda, que reúnem várias marcas, ainda não deram certo no Brasil. Segundo Passarelli, além da tradição da produção de moda de países como a França – sede do grupo LVMH, dona da Louis Vuitton, fundado há 163 anos –, diferenças culturais que prejudicam a atuação no setor por aqui. “Na Europa existe uma cultura de moda. O consumidor paga pelo imaterial. Aqui, a maioria decide pelo preço e pelo que acha feio ou bonito.” 

 

Fonte: Estadão